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No dia 9 de agosto deste ano, completa-se um ano do trágico acidente envolvendo um avião da Companhia, que tirou a vida de 62 pessoas. Desde então, além da tristeza, o setor de transportes (e não somente o aéreo) busca entender o que a sequência de eventos e decisões que antecederam essa tragédia tem a ensinar para outros segmentos fundamentais da logística e mobilidade no Brasil. Uma reportagem recente do G1 trouxe informações novas que podem ajudar líderes de transportadoras a repensar práticas e culturas internas — principalmente quando o assunto é segurança, comunicação e responsabilidade gerencial.

Local exato da queda do avião da VOEPASS

O que aconteceu: O fator humano e a cadeia de decisões

Segundo a apuração da reportagem, um funcionário da empresa relatou que, horas antes do acidente, houve comunicação verbal sobre a falha no sistema de degelo da aeronave. Porém, a ausência desse registro no diário de bordo impossibilitou que providências formais fossem tomadas antes do voo fatídico. Ou seja, sugere-se que uma falha reconhecida existia, mas não foi oficialmente documentada. Com isso, o problema ficou invisível para outros profissionais, ilustrando a perigosa lacuna entre o saber e o fazer — ou, mais precisamente, entre o comunicar e o formalizar.

Imagem do avião da VOEPASS

À primeira vista, esse fato pode parecer restrito à aviação, um setor naturalmente mais regulado e protocolar. Entretanto, esse tipo de falha comportamental e processual se repete com frequência em outros segmentos, especialmente no transporte rodoviário de cargas. Muitas transportadoras possuem sistemas e rotinas para o reporte de defeitos, seja por formulário em papel ou via aplicativo. No entanto, na agitação do cotidiano logístico, tais protocolos podem ser vistos como “burocracia” — e, em momentos críticos, acabam negligenciados.

O paralelo com o transporte rodoviário: O risco invisível da informalidade

Imagine a seguinte situação, bastante comum nas estradas brasileiras: um motorista detecta um problema no sistema de freios do seu caminhão ao preencher o formulário obrigatório antes da viagem. Porém, o veículo já está carregado, a entrega atrasada e a pressão do cliente aumenta. O responsável pela manutenção já viu situações semelhantes, onde a liderança autorizou o prosseguimento da viagem, confiando que “depois conserta”. Dessa vez, ele repete o procedimento, libera o caminhão para seguir viagem e planeja arrumar o defeito somente no retorno.

Em um cenário assim, tudo parece correr bem em várias ocasiões, reforçando a falsa ideia de que “sempre funciona no final”. Contudo, basta um único episódio, como um trajeto longo em trecho de serra, para que uma falha mecânica se transforme em uma tragédia. O acidente, então, não é apenas resultado de uma decisão individual, mas de uma cultura organizacional permissiva, onde a repetição do comportamento fora da regra foi consolidada pelo exemplo vindo da liderança.

Liderança: O exemplo que constrói (ou destrói) a segurança

É preciso compreender que comportamentos em qualquer organização são moldados, em grande parte, pelos exemplos que vêm do topo. Quando gestoras e gestores de transportadoras adotam posturas complacentes diante de regras, mesmo as motivadas por boas intenções (cumprir prazos, agradar clientes), sinalizam para toda a equipe que resultados justificam transgressões. O padrão é rapidamente assimilado e reproduzido por aqueles na “linha de frente”, multiplicando o risco.

Mais que isso, o silêncio ou a informalidade em reportar problemas críticos gera um ambiente de vulnerabilidade. Quando a comunicação não é clara, transparente e devidamente registrada, decisões importantes ficam sujeitas à subjetividade, com alto potencial de consequências negativas não apenas para a empresa, mas para a sociedade e para o próprio colaborador exposto ao perigo.

Comunicação e Processo: Segurança começa pelo básico

Um ponto frequentemente subestimado nas empresas de transporte é o registro formal e a comunicação assertiva de falhas e situações atípicas. Informações ditas “só de boca”, recados enviados por aplicativos pessoais ou permissividade com a falta de documentação abrem brechas para erros que poderiam ser evitados com processos mais maduros.

Implantar protocolos claros de reporte, investir em sistemas digitais intuitivos e realizar treinamentos regulares são ações essenciais — mas não suficientes. É papel da liderança valorizar o uso desses recursos, reconhecer o tempo gasto com segurança como investimento (e não desperdício), e estar sempre disponível para ouvir e acolher relatos que possam antecipar problemas maiores.

O Desafio Cultural: Transformando “burocracia” em proteção

É comum ouvir que os processos de segurança são desnecessários ou atrasam a operação. Essa visão, no entanto, está na raiz de muitos acidentes graves. O caso da reportagem ilustra com tragédia o preço da informalidade e da negligência de procedimentos, mostrando que a “burocracia” nada mais é do que um conjunto de salvaguardas desenhadas para proteger vidas, patrimônio e reputação.

O líder que deseja ver sua transportadora prosperar e se manter longe de manchetes ruins deve enxergar os controles como instrumentos de competitividade e sustentabilidade, não como entraves. Manter a disciplina no reporte e resolução de falhas, estimular o feedback contínuo entre áreas e dar o exemplo — mesmo quando a pressão for grande — é o caminho para consolidar uma cultura responsável e resiliente.

Considerações finais: Segurança é valor estratégico e responsabilidade coletiva

O acidente aéreo que aqui abordamos, com suas circunstâncias e consequências, é um poderoso lembrete para o transporte rodoviário nacional: não existe resultado sustentável sem uma cultura sólida de segurança. Processos claros, comunicação formalizada e, principalmente, liderança atuante fazem toda a diferença entre um incidente controlado e uma tragédia.

Cabe aos líderes — donos, diretores, gerentes e coordenadores — repensar suas posturas, rever prioridades e cultivar, diariamente, o compromisso de proteger pessoas e ativos. Segurança não pode ser tratada como tarefa secundária, mas sim como valor inegociável e diferenciar competitivo para empresas que desejam avançar em um mercado cada vez mais exigente e desafiador.

Como a sua liderança influencia a cultura de segurança na sua empresa? O que pode ser feito hoje para tornar o ambiente rodoviário mais seguro amanhã? Reflita, compartilhe e seja o exemplo que sua equipe precisa.

👉Como a sua liderança tem impactado a cultura de segurança na sua empresa? A pressão por resultados justifica flexibilizar regras ou é possível construir um caminho sustentável que una produtividade e proteção?

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🔗 Leia o texto original do Tibério no LinkedIn: Tibério Pereira

Artigo escrito por Tibério Pereira – Consultor em Road Safety, SSMA e Logística | Redução de Sinistralidade e Custos Operacionais | Experiência em Esso, Cosan, Raízen | Implantação de Inovação em Grandes Embarcadores e Transportadoras

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